Eu caminho prestando atenção. Serpenteio pelas ruas do meu bairro em busca de novos cenários, de novos aromas, de novos rostos. Não ligo pras rotas, o que me impede de saber exatamente onde estou – ou como chegar ali novamente se um dia assim o desejar. Mas isso me permite a surpresa quando esbarro de novo em uma casinha querida, ou quando meu olfato é preenchido pelo mesmo cheiro de feijão cozinhando, ou quando cruzo por pessoas e por cachorros que se repetem ao longo dos dias. Jamais faço o mesmo trajeto. Por vezes, ando em zigue-zague; por outras, em linha reta, até ela dobrar-se por vontade própria. Na imensa maioria, porém, sigo por onde me apraz.
Ao longe, vislumbro um prédio alto – e busco um caminho qualquer até alcançá-lo. Observo as casinhas que se amontoam, as igrejas coloridas, os paralelepípedos desnivelados e as graminhas que brotam de um minúsculo espaço no concreto. Nos fones, ouço um podcast que discorre sobre o tempo. Antes, era mais fácil estar presente e prestar atenção até nas menores banalidades. Hoje, a memória falha e sentimos a necessidade das telas pra elucidar qualquer questão. A gente se perde fácil nesse emaranhado. Nos meus caminhos tortos, me permito me extraviar de mim mesma, e me liberto de querer saber tudo. Deixo os percursos imperfeitos e acidentados tocarem meus pés. E é assim, alheia, que me percebo.